Direitos humanos e segurança pública

Diariamente a mídia noticia novas rebeliões de presos. O pano de fundo dessas rebeliões é a prisão sem culpa formal, em que a prisão preventiva ou em flagrante se prolonga por anos. Em muitos casos, o preso responde por pequenos delitos, e, se condenado, acabaria por cumprir a pena em regime aberto, mas a prisão preventiva se prolonga por anos a fio, o que, na prática, se configura um crime perpetrado pelo Estado. Para reverter essa situação absurda e, ao mesmo tempo, garantir a incolumidade física dos presos, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), lançou terça-feira (24) no Fórum Criminal da Barra Funda, na capital paulista, o projeto Audiência de Custódia.

O objetivo da iniciativa, inédita no Judiciário nacional, é apresentar presos em flagrante aos juízes no menor prazo possível, para que o magistrado decida se a prisão deve ser mantida ou substituída por liberdade provisória. No primeiro dia de atividades, quatro juízes trabalharam em dois turnos para atender a 16 flagrantes relativos a furto, roubo, tráfico de entorpecentes, apropriação indébita, porte de arma e associação para fins de tráfico. Foram 25 indiciados, dos quais 17 receberam liberdade provisória e oito tiveram o flagrante convertido em prisão preventiva. “Muitas vezes se tem a falsa ideia de que as pessoas são absolvidas de plano e não têm mais nada com a Justiça, mas não é isso. Essa audiência serve para ver a necessidade, ou não, da prisão. A pessoa que recebeu outra medida cautelar, deve seguir essa cautela sob pena inclusive de essa liberdade provisória ser revogada”, explica o juiz coordenador do Departamento de Inquéritos Policiais (Dipo), Antonio Maria Patiño Zorz.

Entre as exigências que podem ser determinadas pelo juiz, estão a atualização de endereço, apresentação em juízo e recolhimento em domicílio. De acordo com informações do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Alexandre de Moraes, compareceu no lançamento do projeto e prometeu licitar 20 mil tornozeleiras eletrônicas, mais uma entre as medidas alternativas à prisão. Segundo o juiz Antonio Patiño, o fato de o juiz decidir mais rápido não significa que o processo foi analisado às pressas. “Se o juiz já extrai da leitura do flagrante que o preso pode responder em liberdade, a audiência pode acrescer novas informações, que podem conferir segurança ao juiz. O juiz está decidindo mais rápido, mas com mais elementos, o que é essencial para resgatar o que tínhamos esquecido, que é a dignidade do ser humano”, destaca.

Inicialmente, o projeto está restrito aos casos registrados na 1ª e 2ª seccionais da capital paulista (Centro e Sul), mas deve ser ampliado para toda a cidade em poucos meses. A ideia deve ser replicada em tribunais de todo o país em breve. “No próximo encontro de corregedores que ocorrerá no Piauí, vou levar um relatório mostrando como o projeto foi desenvolvido aqui. Inclusive recebemos hoje juízes ligados à Corregedoria da Bahia”, conta o corregedor-geral do TJSP, Hamilton Akel.

Ao destacar o pioneirismo do projeto, o desembargador elogiou o presidente do CNJ, Ricardo Lewandowski. “É preciso lembrar que a ideia inicial veio do CNJ, do ministro Lewandowski, profundo defensor das garantias e dos direitos humanos”, aponta o desembargador. O juiz Antonio Patiño informa que as expectativas para o projeto são altas, considerando o interesse e engajamento dos diversos atores envolvidos, como policiais civis e militares e integrantes do Ministério Público e da Defensoria Pública. “Cada qual na sua atividade está atuando com muito respeito e muita atenção, dando a oportunidade para o juiz deliberar com segurança”, analisa. (Com a Agência de Notícias do CNJ)